Prevista para acabar no final de maio, a novela Salve Jorge
não obteve melhora de audiência, nem mesmo na reta final. Os índices a apontam
como o folhetim das 21h menos assistido da história. Motivos não faltam,
poderia dedicar todo texto de hoje a eles. Porém vou discorrer sobre algumas
marcas pessoais de Glória Perez que podem ter prejudicado a busca do sucesso. Apesar de quase sempre ter
êxito com dramas reais pouco discutidos, como transplante de órgãos (De corpo e
alma, 1992), dependência química (O Clone, 2001) e agora tráfico de pessoas,
ficam evidentes do lado negativo as trocas não intencionais de protagonistas e volume imenso de
personagens.

Casos parecidos já ocorreram em tramas da autora, como Raj
(Rodrigo Lombardi) que tomou o lugar de par da protagonista de Caminho das
Índias (2009). Na ocasião, Bahuan (Márcio Garcia) iniciou como par de Maya
(Juliana Paes). Antes da mudança, Raj parecia
ser um obstáculo para o casal. A novela foi um sucesso, vencedora do Grammy. Foi
lançada no momento certo, em que a Índia estava na moda em todo mundo, impulsionada
pelo filme vencedor do Oscar Quem quer ser um milionário, de Danny Boyle
(2008).
Outra troca semelhante se deu em América. Menos espaço na
tela – e no coração de Sol (Debora Secco) - para Tião (Murilo Benício), mais para Ed (Caco Ciocler). É desnecessário expor a vantagem que uma
novela tem quando o núcleo principal como um todo conquista o público e segue assim
ao longo da trama. Mudanças causadas por opiniões do público nunca é um bom
sinal.
Se por um lado João Emanuel Carneiro (Avenida Brasil, A
Favorita) prefere ter um elenco bem enxuto, Glória Perez não se preocupa em
alongar sua lista de astros. A última trama de João teve 32 personagens fixos
contra 96 da atual novela das 21h. As duas opções tem prós e contras. Ter menos
pessoas implica em menos tramas, o que cativa com mais facilidade a atenção do
espectador. Os atores, por outro lado, ficam exaustos. Mais personagens torna a
história confusa, com passagens frívolas e alguns atores se sentem abandonados.
Ademais, gera uma série de furos, perde-se dados. Fatores esses que geram
reclamações como o delegado colega de Helô não reconhecer Wanda ou Érica
(Flávia Alessandra) ter carro e precisar de táxi para fazer sua mudança para a
casa de Téo. Isso me lembra do seriado Lost. Os espectadores se impressionavam
com Hurley, que não emagreceu um kilo sequer estando mais de 100 dias na ilha e
com Locke ter embarcado no avião portando uma mala cheia de facas. Ainda mais depois do
“11 de setembro”! Mas o fato de um avião
cair no meio de uma praia e a maior parte das pessoas sobreviver não parecia
ser um problema. Da mesma forma, Morena, que de casa 10 palavras solta 9 gírias,
bate o maior papo com turcos que tem pouco ou nada a ver com o Brasil.
Conclui-se que público já está acostumado com esse tipo de liberdade narrativa.
Mas voltando ao número excessivo de coadjuvantes. Eles
despertam pouco interesse no início da trama, parecem soltos, criados para
“encher linguiça”. Mas considero instigante como esses mesmos se tornam cada
vez mais peças fundamentais na solução da trama central. Dessa forma, o excesso
de personagens se torna um estilo narrativo elegante. É o caso dos chamados
filmes multi-plot ou multi-enredos, presentes nas filmografias de Robert Altman
(Nashville e Shortcuts), P.T. Anderson (Boogie Nights e Magnólia), Alejandro González Iñárritu (21 gramas, Amores Brutos e, mais notável em Babel), além do recente 360, de Fernando
Meirelles. Nesses filmes, histórias sem uma conexão clara são contadas
paralelamente. Porém no final sempre é possível ver a convergência desses
enredos, seja fisicamente, seja em suas essências. Pode-se dizer que Salve
Jorge tem esse trunfo. Mas perde a credibilidade pelos já citados furos. O
perfil de cada personagem deve ser muito organizado quando a quantidade usual de tramas para meio é extrapolado.
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Filmes multi-plot. Surpresas e satisfação quando tramas paralelas se aproximam. |
“Em nome do pai”, de Walcyr Carrasco irá substituir Salve
Jorge. O autor terá que se adaptar ao horário. Abdicar de seus clichês, cômicos
e típicos de novelas de época para se firmar no primeiro
escalão de autores da faixa das 21h. Cada vez mais, o público mais maduro, das 21h, quer ser surpreendido. Esse é um dos primeiros passos para conquistar a audiência do horário. Torcemos para que ele abandone mais vícios que
sua colega Glória Perez.
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